As coisas que fazem a minha vida
Há coisas na vida que me despertam bastante o interesse. E não sei se é desgosto ou prazer sentir que sou, por vezes, um apreciador solitário dessas coisas. Por um lado, o desgosto vem do facto de não ter ninguém com quem partilhar, de forma genuína, o meu olhar contemplativo sobre essas coisas. Por outro lado, o prazer vem daquele egoísmo tão propriamente humano de querer guardar apenas para si próprio algo que considera precioso. Haverá coisa mais preciosa no mundo que o nosso olhar sobre ele?
Uma aprendizagem que fiz nestes últimos meses da minha vida, é que ninguém vê a mesma paisagem da mesma maneira embora ela seja, efectivamente, igual. Até porque nem a própria pessoa é capaz de ver a mesma paisagem sempre da mesma forma. Por isso, quando olho para esta paisagem que é a vida, pergunto-me, solitariamente, se será que sou o único a contemplar, com um certo deleite, aqueles pequenos e ínfimos pormenores que parecem ter nascido apenas e só para serem ignorados? Sim, porque esses pequenos e ínfimos pormenores são aqueles com os quais nunca perdemos grande tempo a falar. É quase como se passámos a vida inteira a fugir deles. Como se fossem um incómodo ingrato reparar que existem. Apesar de, em boa verdade, serem a razão da nossa existência.
A propósito disso, um dia disse para os meus amigos da faculdade:
Aquilo que mais vou sentir pena de perder na vida é justamente a oportunidade de apreciar tudo aquilo que sempre esteve cá e ficará para além de mim. Sentir que as coisas que compõem a imagem de fundo da minha vida ficarão sempre cá, à espera de serem apreciadas e vividas por outras pessoas. Imaginar que aquele pôr-do-sol que raiava esplêndido sobre o final do meu dia, haverá de raiar também sobre o dia de tanta outra gente que virá depois de mim.
Sei que apesar dos meus esforços em explicar bem o sentido destas palavras, ninguém as terá sentido como eu as senti. Talvez lhe tenham dado alguma importância, talvez as minhas palavras tenham provocado alguma espécie de ressonância neles. Mas não tenho ilusões: por mais que eu me esforce para tentar perceber Picasso, nunca poderei dizer que consigo ver os quadros que ele queria pintar. Por isso é que o homem inventou Deus. Para ter alguém que, lá no fundo, o compreenda.
No fundo, todos nós contemplamos a vida de forma diferente. Pois é único o nosso olhar sobre ela. Podemos, por vezes, cativar a atenção e influenciar o modo de ver dos outros sobre certos pormenores que nós contemplamos com prazer. No entanto, nunca faremos do nosso olhar o olhar do outro, assim como este nunca fará do seu olhar o nosso olhar. Essa é por isso a maior tristeza que há: a de por vezes vermos uma coisa belíssima para nós e que não pode ser inteira e genuinamente partilhada.
Por vezes seria bom vermos no mesmo plano e sentirmos com a mesma intensidade. Quantas vezes nos sentimos tristes porque queríamos que certas pessoas vissem e sentissem como nós, mas se assim fosse, não deixaria margem para o desenvolvimento do nosso imaginário! Beijinho continua a escrever e a sonhar..
ResponderEliminarMais importante que partilhar o mesmo olhar e o mesmo sentir de algo (um momento, uma paisagem, um pormenor), é partilhar o momento dessa descoberta, dessa visualização maravilhosa... por isso, não importa que o outro não veja ou sinta o mesmo, desde que esteja connosco!
ResponderEliminare dito isto, só consigo ficar triste, porque vim aqui porque tava com saudades, e agora em vez de as amançar, descobri e é gravissimo, porque estou a ver vários por-do-sol, mas estou sozinha!
beijo grande